segunda-feira, 21 de maio de 2012

Oresteia

ORESTEIA
Autor: Ésquilo

  “Consagro as minhas tragédias ao tempo”
Ésquilo

 “Contemplai os dois tiranos da pátria, assassinos de meu pai e destruidores desta casa…”
 Orestes/Coéforas

Oresteia, uma tragédia da Europa. Em busca de um teatro político
Com Oresteia, queremos fixar-nos na contemporaneidade. Em NÓS! Nesta nossa – por herança de bastardos – Europa. Essa mítica, bela e quente Europa que se banhava no Poleponeso, amamentada no berço pela Hélade para não deixarmos que a Memória nos atraiçoe. A velha vontade, há tanto acalentada, de destruição da nossa querida Europa recrudesce e os novos turcos, são afinal os nossos irmãos de ontem. Eles estão hoje no meio de nós e esperam o momento. Com Oresteia, queremos fixar-nos na Europa a partir do sul. Com os pés nas areias mediterrânicas, num tecto de estrelas, com o azeite a alumiar e um ramo de oliveira na mão... A Europa perdeu o rumo na volta da guerra. Os comandantes tresmalharam-se, embebedaram-se e ufanos de poder, declararam guerra aos povos. Esta Europa, casa dos Átridas, berço de nações e de culturas, de hábitos de convivência entre homens e deuses está cativa, qual Cassandra. A Europa, esta Europa toda, arrogante e faminta, sobrinha de todos os aleijados mentais da segunda guerra, é a Europa de líderes/títeres, com armaduras de deuses num Olimpo de circo. Com máscaras de olhos vazios e dentes roubados nos campos de concentração, funis de petróleo nas bocas e coturnos feitos de ossos nas valas comuns. Continuam a arrasar altares, pois já nada os indigna. Já não há deuses que nos acudam, nem homens que os interpelem. A nossa Europa é hoje uma massa informe, gelatinosa, que se apega ao que passa. Com Oresteia, as máscaras desta tragédia europeia, escondem rostos singulares, de “deuses castigadores que a democracia erigiu,” e que do alto do seu Olimpo olham com jactância os Coros de deserdados que vagueiam atordoados e começam a interrogar o capital, esse deus ex-máquina. E assim, nesta trilogia trágica, entre deuses sem linhagem e humanos desumanizados, se ensaiará um novo paradigma de JUSTIÇA. Com Oresteia o que se conta é a história desta Europa, depois da segunda guerra, alquebrada e moribunda, cansada da vitória. Dividida como uma família desavinda onde impera o ódio, a inveja e a intriga. Esta Europa/Clitemnestra a um passo, puta e mãe, Agamémnon e Egisto, Orestes e Electra. Esta Europa com tantas Cassandras no ouvido. 
Esta Europa, a mediterrânica, tem de libertar-se e acabar de vez com os velhos deuses que nos querem enlouquecer. Nem estamos condenados, qual Efigénia, nem somos tão volúveis, quanto Helena. A guerra, esta guerra é para ser ganha pelo Coro de cidadãos de Atenas…
Rui Madeira

Projecto ORESTEIA: trilogia Agamémnon; Coéforas e Euménides
de Esquilo encenação de Rui Madeira
  Oresteia (Agamémnon, Coéforas e Euménides) - CTB no YOUTUBE:  

“Há dez anos em guerra, o coro dos anciãos reúne-se em frente ao palácio para manifestar o descontentamento e ansiedade que grassa em Argos. Qualquer desfecho em Tróia não trará bons augúrios. Ares não está no seu posto e a cidade está mal governada, nas mãos de corruptos e malfeitores, como afirma o Vigia no seu testemunho de sofrimento.
1. Agamémnon

Anunciada a vitória, Agamémnon volta a casa com a escrava preferida, Cassandra. Recebe-o o coro em silêncio e redobrada angustia e é Clitemnestra, a adúltera, que, tecendo a teia, faz os elogios públicos, levando-o a entrar no palácio sobre um tapete de púrpura, digno dos deuses. Cassandra, a cativa, a ex-amante de Apolo recusa entrar e, possuída pela maldição do deus, anuncia à Cidade o cheiro a sangue que aquelas paredes exalam, fruto dos antigos e futuros crimes ali perpetrados. Aumenta o temor, os rumores adensam-se. Espera-se em Zeus, e um desejo de morte colectiva surge como solução apaziguadora da angústia. Cassandra discute com o coro e entra decidida no palácio, para que a sua morte sirva como testemunho para memória futura. Ouvem-se os gritos lancinantes de Agamémnon a ser barbaramente assassinado pela esposa que exibe os cadáveres na varanda do palácio. Cumpriu o seu desígnio. Vingou e está no seu posto. E com Egisto, o estrangeiro, urdidor da trama, fruem a luz amável do dia portador da justiça! O Coro desorientado com tamanha desgraça manifesta o desejo de vingança e a esperança em Orestes o filho de Agamémnon, exilado.

2. Coéforas

Dez anos mais tarde, num tempo de terror, Orestes regressa a Argos, como estrangeiro, com seu amigo Pílades, na esperança de vingar a horrenda morte do pai. Clandestinamente visita o túmulo interdito e abandonado de seu pai e, por um acaso, que só os deuses explicam, encontra no local um grupo de escravas troianas de Clitemnestra e, entre elas, no meio do maior sofrimento, sua irmã Electra. Com a irmã e o grupo de escravas traçam o plano para a morte da mãe e do amante Egisto. Anuncia-lhes o pacto com Apolo e com Pílades apresentam-se na porta do palácio, quais estrangeiros, em busca de hospitalidade. São recebidos por Clitemnestra a quem trazem notícias da morte de Orestes. Entram e como o apoio das escravas, Orestes e Electra vingam a morte do pai, matando Clitemnestra e Egisto. Exibem os cadáveres à cidade dizendo: “contemplai os dois tiranos da pátria, assassinos de meu pai e destruidores desta casa”.

Depois de perpetrado o matricídio, o remorso apodera-se de Orestes e, como um louco, foge perseguido pelas Erínias vingadoras de sua mãe.

3. Euménides

Perseguido pelas Erínias, exausto, ensanguentado e descrente Orestes dirige-se a Delfos ao templo de Apolo, colocando em questão a sua capacidade para cumprir o acordo com o deus. Apolo discute com Orestes, obriga-o a cumprir o acordado e, como prova do seu poder, adormece as Erínias, dando-lhe algum tempo para continuar a viagem até Atenas, onde deve suplicar o patrocínio da deusa Atena. O espectro de Clitemnestra vem fustigar as Erínias adormecidas, exigindo vingança sobre o filho. Orestes chega ao templo de Atena e esta decide levar a questão a tribunal. E um novo tribunal é constituído. O julgamento do caso Orestes e Clitemnestra, representados no tribunal por deuses é, curiosamente, feito por homens, seleccionados e presididos por uma deusa nova (Atena). Sendo as partes do processo os antigos e novos deuses, o resultado é um empate. Neste caso, mandava a lei que se favorecesse o réu. Orestes é assim absolvido e as Erínias, uma vez amansadas, são transformadas em deusas benévolas (Euménides). (Rui Madeira)”



Falar verdade a mentir

 FALAR VERDADE A MENTIR 

Encenação e Dramaturgia: Rui Madeira

 


(Circuito escolar) 

“Vivamos livres ou morramos homens”
A. Garrett em tragédia Lucrécia

Ao longo dos anos, a CTB tem vindo a inscrever nas suas escolhas espectáculos dirigidos aos jovens públicos, usando textos clássicos ou contemporâneos que integram os curricula de Português e Literatura. Autores como Gil Vicente, Eça de Queirós, Almada Negreiros, Manoel Teixeira-Gomes, Sophia de Mello Breyner, Manuel António Pina, Bernardim Ribeiro, Sá de Miranda e Camilo Castelo Branco foram objecto de abordagem no âmbito dos projectos de formação de públicos. Este espectáculo é mais um momento na vontade de possibilitar aos futuros públicos a aproximação a um autor fundamental da nossa cultura.
Através de uma série de acções concentradas (no âmbito do BragaCult), vamos criar condições para que esses jovens públicos e professores se possam apropriar dos processos de criação, ganhando um “olhar por dentro” da coisa artística, aprendendo a “ler” e a interrogar esses textos à luz de uma nova realidade – a prática teatral.
O objectivo é criar melhores públicos, novos espectadores que dominem melhor os códigos de leitura dramática, capazes de se estimularem para lá do que lhes é apresentado, entendendo que toda a obra de arte é/ deve ser aberta. E que a sua posição de espectador activo é que lhe há-de conferir o seu verdadeiro significado.


Com Falar Verdade a Mentir pegamos num texto de um autor maior, na tentativa de «mostrar» aos espectadores as ideias que subjazem na estrutura dramática da peça. A luta do autor pela revolução romântica nas letras e no texto português. A verdadeira modernidade, sem se fixar no culto do passado que encontramos noutros autores. Com Almeida Garrett e com Falar Verdade a Mentir podemos observar com humor corrosivo onde o discurso é passadista, sem vida e onde se cruza com o novo olhar dos tempos e das desilusões do Presente. Com Almeida Garrett e Falar Verdade a Mentir são razões estéticas e ideológicas que enformam o discurso teatral, é o cerne da revolução romântica. A promoção do «sujeito» em instância estruturante de si mesmo e do mundo em que evolui. E essa dinâmica está explícita nos discursos dos vários personagens. Um divertimento teatral num espaço de debate e experimentação.

Rui Madeira




 






Cenografia
Carlos Sampaio, Rui Madeira
Figurinos
Sílvia Alves
Criação vídeo
Frederico Bustorff Madeira
Criação de som
Luís Lopes


segunda-feira, 22 de agosto de 2011

JARDIM

 Jardim
"Pedro e Inês - a história secreta nunca antes contada"

Ficha artística:
Autor e encenador: Alexej Schipenko | Tradução: António Pescada | Elenco: André Laires, Carlos Feio, Frederico Bustorff Madeira, Jaime Monsanto, Rogério Boane, Rui Madeira, Solange Sá, Thamara Thais e João Chelo | Cenografia e figurinos: Samuel Hof | Criação vídeo: Frederico Bustorff Madeira | Criação sonora: Luís Lopes | Desenho de Luz: Fred Rompante | Grafismo: Carlos Sampaio | Fotografia: Paulo Nogueira


Esta é uma história muito conhecida em Portugal e, no nosso espectáculo, é contada de uma maneira diferente - talvez como diário de Inês de Castro.
Neste diário ela descreve o seu primeiro encontro, o amor, a vida com Pedro, e o seu assassinato. Contudo, o seu diário continua para lá da sua morte. Até à exumação do seu corpo e coroação como rainha de Portugal, Inês relata o que acontece com aqueles que permanecem vivos.
O objectivo de “Jardim” é criar a imortalidade do amor, sendo também importante para o espectáculo a arquitectura do Theatro Circo porque levará o corpo físico do espectador do fundo do inferno até à última nuvem do paraíso, num processo em tempo real.
O meu trabalho de alguns anos com a Companhia de Teatro de Braga dá-me a possibilidade de fazer este espectáculo único, para glória e espírito da cultura portuguesa, com um agradecimento especial a Rui Madeira.

     Alexej Schipenko

Mais fotografias e informação no site:

quinta-feira, 7 de abril de 2011

"Transit"

Transit

Dois homens que se encontram. Dois mundos que se cruzam. Como num filme. Sem psicologismos. Sem teatro. A reinvenção da sobrevivência através da Palavra. Cada um encontra no Outro a razão da sua permanência ali/aqui. Duas vidas jogam-se no silêncio da espera. Nunca se perceberá quem é caçador e quem é caçado. Neste jogo é vital não perder o argumento. A Palavra mata!
Um exercício sobre o não teatro, levando os actores à procura de um tom em que cada frase dita, resulta apenas do prazer de não se deixar matar. A capacidade de especular sobre cada momento na busca da energia para aguentar o combate no momento seguinte, é o que mantém a Vida. Tudo pode ser verdade e mentira. Tudo hoje é verosímil, tudo é espectacular. Já não nos aguentamos sem máscara…
Jet Lag e Check In são, afinal, dois actores numa luta pela sobrevivência.
Regina Guimarães e Saguenail criaram uma obra teatral densa, “escondida”, estilo “quebra-cabeças” que obriga a um profundo e aturado trabalho de experimentação dramatúrgica com os actores. Sim, se é verdade que todos os espectáculos precisam de dramaturgia, este texto exige-a! Impõem-na como um exercício lúdico. É, neste caso, mais um jogo de vida, mais um duelo entre os dramaturgos, dum lado e encenador e actores, do outro.
Partimos para a encenação experimentando o texto no corpo dos actores, explorando uma proposta que conduza os espectadores a uma situação de tensão, como num filme de suspense. Queremos que a dúvida se instale sobre os personagens, o que fazem ali e o que pretendem.

Rui Madeira

TRANSIT é um texto que começa a abrir caminho no aeroporto de Milão, numa daquelas situações de black-out informativo em que nem se parte nem se sabe quando se vai partir. Para resistir à fúria, praticam-se pacatos exercícios de observação: cartazes, painéis, sinais, montras, carrinhos, fardas, bichas. Repara-se então nos mínimos e nos máximos de sobrevivência que o aeroporto oferece, desde cigarros e pastilhas elásticas até casacos de arminho e massagens VIP. Repara-se nas pessoas: os que andam perdidos, os que avançam em piloto automático, os que parecem solitários, os que têm ar de pessoa colectiva. E surgem, antes de tudo, os nomes dos dois protagonistas, JET LAG e CHECK IN, como se os nomes fossem a caverna e os tesouros, os ladrões e o abre-te sésamo. De súbito, torna-se óbvio que os tijolos da construção que a cabeça se atreve a erguer, ainda sem alicerce, se inspiram na massa de semelhança entre a pequena cidade aeroporto e a cidade securitária formatada pelo neoliberalismo. Assalta-nos a recordação inolvidável das reuniões da Câmara Municipal do Porto em que o cidadão distraído pode descobrir o «projecto de cidade» que lá se trama – feita de falsos hotéis de charme, spas new age, mais parkings do que parques, restauração rápida disfarçada de gourmet, e bué da lojas de griffe... – é tão-só uma cópia a céu aberto (?) dos corredores de aeroporto. E são essas estudadas parecenças, a par dos terríficos sentidos de que são portadoras, que nos convencem a não deixar a «peça» nascente no lixo do devaneio.
De que maneira a luta de classes se manifestaria no espaço confinado e videovigiado de um talk show televisivo? É a esta pergunta que encarregamos JET LAG e CHECK IN de ir respondendo, dotando-os da possibilidade e da vontade de criar rompimentos, de furar o aquário onde asfixiam com a ponta acerada das suas pequenas e grandes raivas.
TRANSIT foi-se escrevendo, via correio electrónico, entre o Porto e Calcutá. É um objecto do qual gostaríamos que se conservasse a estranheza (também de o termos levado a bom termo) e o peso paradoxal do improviso (ping-pong entre autores e entre personagens, os primeiros distantes, mas próximos; os segundos próximos, porque reunidos pelo espaço improvável da representação, mas irremediavelmente distantes). Será possível um objecto em palco manter-se em trânsito?

Regina Guimarães e Saguenail, Março de 2011


Transit de Regina Guimarães e Saguenail
Encenação: Rui Madeira
Assistente de encenação: Solange Sá
Actores: Rogério Boane e Waldemar de Sousa
Espaço Cénico: Carlos Sampaio, Solange Sá e Rui Madeira
Figurinos: Sílvia Alves
Desenho de luz: Fred Rompante
Espaço sonoro: Luís Lopes
Criação vídeo: Frederico Bustorff Madeira
Criação gráfica: Carlos Sampaio
Fotografia: Paulo Nogueira
M/12




Mais informações:
http://www.ctb-transit.blogspot.com



ÚLTIMO ACTO
Um espectáculo de Rui Madeira, Anna Langhoff e Alexej Schipenko

Espectáculo de Rui Madeira, Anna Langhoff e Alexej Schipenko regressa ao Pequeno Auditório do Teatro Circo para mais uma série de espectáculos.
Denominado de não-teatro, Último Acto é um retrato cruel e cómico sobre as relações de poder no teatro, um olhar descarnado sobre as práticas e a cultura teatrais, onde o público é parte implicada e assume o papel de actor da história.
Composto pelo texto homónimo de Anna Langhoff e pelo texto Arte do Futuro de Alexej Schipenko, a peça conta com a interpretação de Solange Sá, Waldemar de Sousa, Rogério Boane, André Laires, Frederico Bustorff Madeira e Vicente Magalhães.

Sinopse:
Último Acto, de Anna Langhoff, foi representado pela primeira vez no Teatro Gorki, dirigido pela autora. Trata-se de uma peça que decorre durante um ensaio, próximo da estreia, a partir do momento em que o encenador é “visitado” pelo escritor/dramaturgo. Este deseja que aquele escolha dirigir um texto seu. Um retrato cruel e cómico sobre as relações de poder no teatro, um olhar descarnado sobre as práticas e a cultura teatrais e o entendimento ou desconhecimento que delas fazemos.
A Arte do Futuro, de Alexej Schipenko, é um texto onde também se fala de arte, de deus, da morte, do mundo, dos nossos desejos e medos.

Um espectáculo de Rui Madeira, Anna Langhoff e Alexej Schipenko | Assistentes Carlos Feio e André Laires | Com Solange Sá, Waldemar de Sousa, Rogério Boane, André Laires, Frederico Bustorff Madeira e Vicente Magalhães | Tradução Helena Guimarães e Regina Guimarães | Desenho de luz Fred Rompante | Ambiente sonoro Luís Lopes | Criação vídeo Frederico Bustorff Madeira | Criação gráfica Carlos Sampaio | Fotografia Paulo Nogueira | M/16




quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A Cabeça do Baptista



A Cabeça do Baptista

Encenação: Manuel Guede Oliva

Escritor: Don Ramón María del Valle Inclán

“Melodrama para marionetas” - foi desta forma que o grande Don Ramón María del Valle Inclán definiu “A Cabeça do Baptista”, peça que configura o “Retábulo da avareza, da luxúria e da morte”. O seu argumento é conciso, categórico, como uma pancada imprevista que com o seu aperto quisesse paralisar as personagens de um rito que vinham entretendo as horas entre sombras de nada.
Alberto Saco, conhecido por “El Jándalo”, chega a uma aldeia indeterminada, num lugar inefável, com o propósito explícito de vingar-se de Don Igi, um indiano que fora em tempos amante, ladrão e assassino da Baldomerita, a mãe do recém-chegado.
Don Igi vive agora, à falta de melhor companhia, amancebado com Pepona, uma espécie de prostituta irreverente e vulgar. Diante da aparição de Alberto Saco, a ela irá confiar os seus medos e nela encontrará o seu maior aliado. Os dois planeiam a vingança, mas é Pepona quem lhe dá o alento moral que tem de resultar numa execução fria e exacta. Uma crueldade premeditada, pérfida e nocturna envolve a peça.
A tragédia para estas personagens do melodrama começa precisamente onde o melodrama e a marioneta concluem. “A Cabeça do Baptista” é uma obra num acto que tem uma óbvia afinidade simbólica com a história grotesca de São João Baptista, Salomé e Herodes.
(Manuel Guede Oliva)

Autor: Ramón del Valle Inclan | encenação: Manuel Guede Oliva | assistente de encenação: Thamara Thais | tradução: António Pescada | cenografia: escultor Rui Anahory | figurinos: Silvia Alves | desenho de luz: Fred Rompante | criação de som: Nuno Mendonça | imagem: Frederico Bustorff Madeira | criação gráfica: Carlos Sampaio | Actores: Solange Sá, Waldemar Sousa, Rui Madeira, Carlos Feio, Jaime Soares, André Laires, Rogério Boane

http://www.theatrocirco.com/agenda/evento.php?id=573


No início do século passado perguntaram a Valle-Inclán como imaginava que seria o teatro no séc. XXI. Ele, que na altura andava a fugir de uma cena provinciana, burguesa e que, portanto, já era um autor problemático para o seu tempo e de difícil materialização cénica, respondeu rotundo ao jornalista que se o soubesse já o estaria escrevendo.
Estamos agora a um século daquela pergunta e o teatro de Valle-Inclán aparece diante de nós coarctado de uma arquitectura actualíssima, como recém-imaginado para se afundar nas tensões do homem de hoje, luxúria, avareza e morte, e agarrar-nos nas correntes de uma contemporaneidade perplexa, submetendo a nossa acção ao seu ditado radicalmente moderno, como se, verdadeiramente, o seu real compromisso consistisse em escrever para cem anos depois de seu tempo.
Eu, em qualquer caso, como encenador deste aqui e deste agora concreto, não sinto que nada do teatro de Valle-Inclán me resulte anacrónico, velhas heranças de sobrado, mas, pelo contrário, a sua proposta teatral obriga-me a imaginar soluções de arriscada exigência cénica.
Bem sei que Valle-Inclán não é um autor frequente nos palcos portugueses embora os mais sábios da tribo conheçam as estreitas relações que o nosso autor manteve com os intelectuais lusos mais comprometidos do momento e a sua vocação republicana. O seu intenso envolvimento com a língua tem-no, paradoxalmente, afastado de muitas literaturas europeias, dada a dificuldade de adaptar os seus textos sem que se veja alarmantemente perdida a sua genialidade.
Por isso, é para mim uma enorme satisfação contribuir para que a sua palavra seja incorporada no reportório de uma das companhias históricas do teatro português, com tudo quanto significa de aprofundamento do diálogo empreendido há muito tempo entre a Galiza e o Norte de Portugal.
Obrigado, claro, a Rui Madeira por tê-lo proporcionado.
Manuel Guede Oliva






Mais informações sobre o espectáculo:

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Trilogia "José Rubem Fonseca"
Uma co-produção da CTB com A Escola da Noite, encenada por António Augusto Barros


Escritor - José Rubem Fonseca
TRILOGIA 1 José 2 Rubem 3 Fonseca.
Uma trilogia Rubem Fonseca, com dramaturgia e encenação de António Augusto Barros, numa co-produção d’A Escola da Noite com a Companhia de Teatro de Braga.
Rubem Fonseca nasceu em Minas Gerais em 1925, mas vive no Rio de Janeiro desde os oitos anos. O seu universo literário é fortemente marcado pelo quotidiano e pela violência latente das grandes cidades, num registo em que o humor, o humor negro, a trama de policial (e, a espaços, a escatologia) servem, afinal, a profunda humanidade das personagens que o habitam.
Formado em direito e com uma (curta) carreira de investigador policial, Rubem conviveu muito de perto com as tragédias humanas que povoam os seus textos. Vem talvez daí a sua recusa tanto em justificar ou relativizar as diferentes formas de violência entre os homens, quanto em produzir discursos universais e moralistas. A complexidade dos homens – dos seus comportamentos, dos seus afectos, dos seus instintos – dá-se mal com as fórmulas simples em que tantas vezes a queremos resumir.
Também por isso, a obra de Rubem Fonseca merece uma leitura abrangente, capaz de descobrir e dar a conhecer as continuidades, as complementaridades, os cruzamentos, os pontos de contacto entre os seus oito romances e as várias dezenas de contos que publicou.
É essa leitura que nos propomos fazer, através do teatro, ao transpor para o palco (pela primeira vez em Portugal) cerca de 20 dos seus contos em três espectáculos diferentes que podem ser vistos autonomamente (um por dia) mas onde os espectadores que virem os três poderão perceber soluções de continuidade que os ligam e ficar com uma imagem mais abrangente da produção literária do escritor brasileiro.
Este espectáculo é a segunda co-produção entre A Escola da Noite e a Companhia de Teatro de Braga, a primeira foi “Sabina Freire” de Manuel Teixeira Gomes, com encenação de Rui Madeira.
Estão definidas condições de acesso especiais para quem queira assistir aos três espectáculos.
Artigo de Quinta-feira, 8 de Abril, 2010 às 10:15, arquivado em Criação, Espectáculos, TCSB, estreias.
Este texto está publicado no site: http://weblog.aescoladanoite.pt/?p=2774